06/07/2007

"Flor de Jagube", de Francisco Grangeiro Filho

Floração de Banisteriopsis caapi, foto de Marco Gracie Imperial

O jagube está aí
É para todos ter amor
Para poder conhecer
O nosso Pai Criador

A folha chegou a tempo
Ela vem mostrar seu valor
Para nos levar à presença
Do nosso Mestre Ensinador

O cipó, a folha e a água
Se juntou toda a harmonia
Para nos levar à presença
Da Sempre Virgem Maria

Estou aqui pra te ajudar
Procurar saber quem é
Aí é o filho de Deus
De Jesus, Maria e José

Fique aqui, vá trabalhar
E não me negue a seus irmãos
Quem está dizendo sou eu
É o velho Juramidã.

(hino 14)

Francisco Grangeiro Filho foi chefe de feitio do Mestre Irineu e membro do chamado Estado Maior do Centro Livre, integrando também a Comissão de Cura. Ingressou na Doutrina a partir dos anos 50 e veio a desposar a filha caçula de Antônio Gomes, Adália, pedindo a sua mão ao Mestre já que desde que Antônio Gomes falecera em 1946 era o Mestre Irineu o responsável pela família, de modo que pode-se considerar Seu Chico Grangeiro como um "genro do Mestre". No antigo CICLU, era ele quem preenchia a função de Gestor, já que era o coordenador dos feitios de Daime. Leia um seu relato :

O milagre que ocorreu comigo foi em 1952. Eu cortava seringa. Um dia, caiu uma casca na minha vista. Passei seis dias sem dormir e comendo muito pouco. O olho começou a espoucar, foi logo ficando branco. Fui para a casa da mamãe. Era véspera de ano. O Mestre passou por lá com o Zé das Neves e eu lhe mostrei a vista. - Olha, Chico, isso aí está ruim. Só um médico pode te ajudar. Eu não tenho ferramenta para isso. - Seu Irineu, se eu tiver que perder o olho é com o senhor. Se eu tiver que ficar bom, é com o senhor. - Tá bem. Segunda-feira você aparece lá em casa. Nessa noite eu dormi, sem remédio, sem nada. Segunda-feira fui lá. Ele estava no roçado e pediu à mulher para me dar um copo de Daime. Eu tomei e fui para casa. No dia seguinte, voltei lá. - Seu Irineu, recebi um hino, mas não achei futuro não. - Quarta- feira, vou abrir um trabalho para você. Ele me deu um copo cheio, mas não senti nada. - Que tal, seu Francisco? - Nada, seu Irineu. - Pois eu mirei. Mirei o seu remédio. Naquele tempo, chegava um doente e ele geralmente atendia na quarta-feira. O doente tomava um copo que ele tinha, assim grande. No meio do trabalho, ia buscar a dieta, buscar o remédio. Todo mundo concentrado. Quando terminava, ele dizia: "O remédio do senhor é tal e tal". Se fosse Daime era Daime, se não, ele falava. - Você tem mel de abelha em casa? - Não senhor. - Pois aqui tem! Raimunda, vai lá e traz aquele vidrinho com mel de abelha. Você molha no algodão e pega um pedacinho de morim e bote dentro bem limpinho. Pinga no seu olho. Assim fui curado. Não tenho nenhum defeito. Eu tinha boa vontade. Eu ia para a mata procurar jagube e foi ele quem me ensinou. Devido a essa minha boa disposição, um dia, de tarde, ele me chamou: - Chico, você vai ser um general da Rainha. Por que eu vou te dar esse cargo? Porque você chega aqui e diz: "Padrinho, encontrei um jagube, encontrei um folhal". Então, eu vou lhe dar essa patente. Se não bromar, estou lhe preparando para quando eu sair daqui lhe deixar no meu lugar. Chico, a Rainha me entregou o mundo. Quem quiser comigo, é comigo. Quem não quiser, é comigo. O tanto que eu mando em cima da terra, do mesmo jeito eu mando dentro do oceano.


O hinário de Francisco Granjeiro Filho se compõe de 26 hinos que mostram que ele se tornou mesmo um General da Rainha. É um hinário também de cura, pois tem seus fundamentos nos trabalhos de feitio, nas idas à mata para coleta de material, nas madrugadas em torno da fornalha de cozimento das panelas. Por isso o intitulamos "Flor de Jagube", por recordar os feitios dessa época do ano, quando o cipó está florido na mata e a ayahuasca parece mais doce.

Extraia as mp3 desse hinário (em talentosa gravação da própria família Grangeiro) juntamente com as letras dos hinos clicando em:


Apoio: Juarez Duarte Bomfim

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