25/07/2007

"Nova Jerusalém"

Xilogravura de Julius Schnoor von Carolsfeld, originalmente parte de Das Buch der Bücher in Bilden.

"Estas coisas me foram concedidas ver e por elas perceber, claramente, o que vem do Senhor e o que vem dos anjos. O que vem do Senhor, eu escrevi, e o que vem dos anjos, não escrevi. Ademais, foi-me concedido falar com os anjos como um homem fala com outro homem, e ver as coisas que estão nos céus e nos infernos, e isto pelo fato de que a Igreja atual chegou ao seu fim, e está às portas o começo de uma nova, que será a Nova Jerusalém. E para esta deve ser revelado que o Senhor governa o universo, o céu e o mundo, que há um céu e um inferno, e como eles são; e que os homens vivem como homens após a morte, os que foram conduzidos pelo Senhor, no céu, mas o que se conduziram a si mesmos, no inferno; a Palavra é a Divina verdade mesma do Senhor na terra; e também que o Juízo Final está cumprido, a fim de que o homem não fique em eterna expectativa neste mundo; além de muitas outras coisas que pertencem à luz que agora surge após as trevas". (Emmanuel Swedenborg)

No MJBI - Messianic Jewish Bible Institute , encontramos as seguintes considerações:

"Vi novo céu e nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe. Vi também a CIDADE SANTA, a NOVA JERUSALÉM, que DESCIA DO CÉU, da parte de D'us, ataviada como noiva adornada para o seu esposo. Então ouvi grande voz vinda do trono dizendo: Eis o TABERNÁCULO DE D'US com os homens. D'us HABITARÁ com eles. Eles serão povos de D'us, e D'us mesmo estará com eles..." (Apocalipse 21.1-3) Veja, como aquele Tabernáculo nos CÉUS, começa sua descida, observe como as orações dos santos se cumprem, observe como que na verdade ao invés de irmos aos céus, é ele que está vindo até nós. Ela vem ataviada, D'us finalmente 'HABITARÁ CONOSCO' e Ele não perguntará mais: "Onde estás?". Então ele transformará o nome da Cidade Santa, pois "... o nome da cidade desde aquele dia será: ADONAI SHAMÁ (O ETERNO ESTÁ ALI)" (Ezequiel 48.35), por isso:"Todos os que restarem de todas as nações que vieram contra Jerusalém subirão de ano em ano para adorar o Rei, O Eterno dos Exércitos, e para celebrar a Festa dos Tabernáculos" (Zacarias 14.16). As nações abrasadas pela habitação de D'us, embriagadas pela sua presença virão ao Monte do Senhor, "as nações andarão mediante a sua luz, e os reis da terra lhe trazem a sua glória... E lhe trarão a glória e a honra das nações..." (Ap 21.24 e 26). Então a ordem do Éden é restaurada, a criação que gemia e suportava angústias por causa do pecado (Rm 8.18 e seg) agora é nova e transformada, pois "No meio de sua praça, de uma e outra margem do rio, está A ÁRVORE DA VIDA..." (Ap 22.2). Nesta Nova Jerusalém "Nela jamais penetrará coisa alguma contaminada, nem o que pratica abominação e mentira, mas somente os inscritos no Livro da Vida do Cordeiro" (Ap 21.27). Veja como este princípio também existe no judaísmo: "... A Jerusalém do mundo vindouro não será como a Jerusalém atual. A Jerusalém atual pode subir quem quiser; à Jerusalém do mundo vindouro somente poderão subir os convocados" (Talmud - Bava Batrá 75b).

Segundo o Vaticano, o Apocalipse de João, mesmo estando cheio de referências contínuas a sofrimentos, tribulações e pranto na face obscura da história está de igual modo repleto de frequentes cantos de louvor, que representam quase a face luminosa da história. Assim, por exemplo, lê-se nele que uma grande multidão, que canta quase gritando: "Aleluia! O Senhor nosso Deus, o Todo-Poderoso, começou o seu reinado! Alegremo-nos, rejubilemos, dêmos-lhe glória, porque chegou o momento das núpcias do Cordeiro, a sua esposa já está pronta" (Ap 19, 6-7). Estamos diante do típico paradoxo cristão, segundo o qual o sofrimento nunca precipita como última palavra, mas é visto como ponto de passagem para a felicidade. Aliás, ele mesmo já está misteriosamente cheio da alegria que brota da esperança. Precisamente por isto João, o Vidente de Patmos, pode encerrar o seu livro com uma última aspiração, palpitante de expectativa trepidante. Ela invoca a vinda do Senhor: "Vinde, Senhor Jesus!" (Ap 22, 20). É uma das orações centrais da cristandade nascente, traduzida também por São Paulo na forma aramaica: "Marana tha". E esta oração "Vinde, Senhor Jesus!" (1 Cor 16, 22) tem diversas dimensões. Naturalmente é antes de tudo expectativa da vitória definitiva do Senhor, da nova Jerusalém, do Senhor que vem e transforma o mundo. Mas, ao mesmo tempo, é também oração eucarística: "Vinde Jesus, agora!". E Jesus vem, antecipa esta sua chegada definitiva. Assim com alegria dizemos ao mesmo tempo: "Vinde agora e de modo definitivo!". Esta oração tem também um terceiro significado: "Já viestes, Senhor! Temos a certeza da vossa presença entre nós. É uma experiência jubilosa. Mas vinde de modo definitivo!". E assim, com São Paulo, com o Vidente de Patmos, com a cristandade nascente, também nós rezamos: "Vinde, Jesus! Vinde e transformai o mundo! Vinde já hoje e vença a paz!".

"Nova Jerusalém" é o título dado pelo Padrinho Sebastião ao caderno de hinários que, após mais de quatro anos sem receber hinos, estando concluído o caderno de "O Justiceiro", foi aberto no Céu do Mapiá em 1983. O primeiro hino, "O Convite", foi recebido após um trabalho, conjuntamente com sua cunhada a Madrinha Júlia. Foi então que foi criada a figura do "hino presenteado", ou "ofertado", antes inexistente pois segundo o Mestre Irineu cada qual devia ser responsável "total" pelas flores recebidas em forma de cânticos em sua trajetória na Doutrina. O primeiro hino foi ofertado à Madrinha Júlia, e a partir daí os hinos seguintes foram todos dedicados a pessoas da irmandade mapiense, concluindo-se com o hino 26, que o Padrinho dedicaria a seu futuro genro, o Padrinho Paulo Roberto, da Igreja Céu do Mar. Justifica-se essa "doação" ou "dotação" de hinos pelo fato do Padrinho ter o seu hinário completo, ou seja, fechado, e querer prosseguir com seus ensinos presenteando os seguidores mais próximos, motivo pelo qual o novo caderno de hinos foi criado. Na verdade, após muitas tribulações para encontrar um lugar de selva onde se estabelecer em definitivo com sua irmandade, o Padrinho Sebastião considerava a vida no "Céu do Mapiá" um novo tempo, e é em torno dessa "nova igreja" que os seus derradeiros hinos estariam dedicados.

Segundo nos relata Walter Dias Junior, no início de 1980, "padrinho" Sebastião anuncia o começo de uma nova fase de peregrinações, em busca de um local para a construção de outra sede para seu grupo: a “Nova Jerusalém na terra”. Ele parte em busca de um local na floresta, capaz de oferecer melhores condições de sobrevivência material para seu grupo, pregando um retorno às origens. Claro que esta sua decisão está de acordo com as instruções "recebidas" do astral, durante a miração. A seguir, ele relata os motivos que o levaram à nova mudança: "... Daqui vou me mudando, porque já me acho cansado de tanta luta aqui e os pastos já estão tão mal divididos que, se planta uma coisa, não dá mais, não tem aquele rendimento. Os próprios campos já estão acabados com carrapicho, coisa dura. Não se tem dinheiro para se botar um trator e virar a terra e as condições de vida cada vez mais difíceis; o preço das coisas cada vez mais alto. Não dá prá mim não. Vou tratar da seringa, ela já está na mata. Está trancada, mas se tratar de zelar dela, vai dando o que comer. Aqui não dá mais..."

No auge desse período, a Cinco Mil chegou a abrigar cerca de 300 a 400 pessoas, ultrapassando seus limites e suas possibilidades de produção. Como as demandas do grupo continuavam avolumando-se e os recursos locais já não bastavam, a alternativa possível era a migração para o centro da mata. Esse movimento teve início em 1980 e, com orientação do próprio Instituto de Colonização e Reforma Agrária -INCRA- a comunidade instalou-se no seringal Rio do Ouro, no município de Boca do Acre, Amazonas, situado às margens do Igarapé Rio do Ouro, na altura do quilômetro 53 da rodovia Br-317. Esta que, segundo o INCRA, seria uma gleba de terras devolutas, passou a ser beneficiada pela instalação da comunidade do padrinho, com a implantação de roçados, a abertura de estradas de seringa para a extração de borracha e várias outras benfeitorias. Sobre esse processo, novamente é Vera Fróes quem nos conta: "...em maio de 1980 iniciou-se o movimento em direção ao seringal Rio do Ouro e no espaço de pouco mais de um ano cerca de 200 pessoas já estavam morando no local, ocupando uma área com cerca de treze mil hectares, explorando vinte colocações de seringa e produzindo 15 toneladas de borracha/ano, residindo em 36 casas, possuindo grandes roçados, criação de patos e galinhas. Para surpresa de todos, o "padrinho" anunciou em 1981 que aquele ainda não era o local determinado pelo astral e onde se ergueria a Nova Jerusalém. Concomitantemente, surgiram pressões de pessoas interessadas nas terras desbravadas pela comunidade. Pessoas que possuíam um título de propriedade com inúmeras irregularidades, ainda do início do século e que dava a área como propriedade de um fazendeiro sulista. Apesar de ter sido a própria representação do INCRA na região quem deu autorização para a comunidade instalar-se no seringal Rio do Ouro...” (1986, p. 120).

(...) Retomando a saga do grupo vinculado ao "padrinho" Sebastião, depois de dois anos de trabalhos no seringal Rio do Ouro, ele abandona o local, devido à demanda fundiária. Então, em 1982, a comunidade foi obrigada a se retirar, sem receber qualquer indenização pelo seu trabalho. Novamente, o grupo dá início a outro êxodo que, dois anos mais tarde, culminará com a ocupação de uma gleba de terras às margens do igarapé Mapiá. (...) Foi o próprio INCRA quem informou à comunidade a existência de outra área arrecadada pela União, sem proprietários, para onde poderiam se transferir. Essa nova gleba de terras passou a ser ocupada a partir de 1982, e localizava-se no Igarapé Mapiá, afluente do Rio Purus, no município de Pauini, Amazonas, ficando distante cerca de 150 quilômetros do seringal Rio do Ouro.

Em 1989, o seringal Céu do Mapiá já reunia em torno de 300 pessoas com residência fixa e mais um outro tanto de população flutuante. A comunidade do padrinho vivia da agricultura e da extração de látex e de castanha, embora essa região não seja muito propícia para ambas atividades. Isso porque, durante décadas, o Mapiá já havia sido explorado como seringal e o manejo predatório destruiu a possibilidade de continuação da extração de látex de boa parte das seringueiras. Essas árvores foram inutilizadas de maneira definitiva devido à utilização de técnicas inadequadas de corte do tronco para a extração do látex. Até hoje, essa região apresenta escassez de peixes, animais e madeiras boas em relação a outras áreas próximas à cabeceira dos igarapés da região, provavelmente também em função da forma de exploração predatória ocorrida desde o início do século vinte.

Talvez em função dessa realidade, durante o período inicial de assentamento já existam planos elaborados pela comunidade, prevendo a necessidade de um novo deslocamento de parte dos moradores da Vila Mapiá para a cabeceira do Igarapé Inauiní, com a finalidade de instalar uma reserva extrativista de látex e castanha: o Trono do Sol. Por enquanto, deve-se ressaltar apenas o fato de que essa proposta revela a necessidade de uma nova retirada do grupo (após a morte do padrinho Sebastião, ocorrida em 20 de janeiro de 1990), agora sob a liderança de Alfredo Gregório de Melo, filho do padrinho. (...) Hoje, o Céu do Mapiá coloca-se como polo assistencial para boa parte dos ribeirinhos da região média do Rio Purus, próximo ao igarapé do Mapiá. São mais de duzentas famílias que, sistematicamente, buscam o apoio da comunidade daimista para auxiliar em sua sobrevivência. A comunidade do Céu do Mapiá possui algumas características peculiares, que a diferenciam, em certos aspectos, dos demais grupos que professam a doutrina do Mestre Irineu. Ela foi a única a retomar a proposta original de comunidade rural praticada pelo Mestre e abandonada no Alto Santo, após seu falecimento. Foi também a única que empreendeu o movimento de expansão do culto em direção a outras regiões do país e do exterior, criando uma igreja sede com estrutura nacional e várias outras a ela filiadas.

Todos esses fatos ocorreram simultaneamente a intenso processo de mudanças sociais, econômicas e culturais por que passou todo o Estado do Acre desde a década de 1970. Nesse período, por exemplo, Rio Branco viveu um processo de expansão que, em dez anos, fez com que a população da cidade fosse duplicada. No bojo desse movimento, a comunidade do "padrinho" Sebastião absorveu com grande intensidade o fluxo de jovens de classe média e de origem urbana de outras regiões e países, que migraram para lá, provavelmente em busca de uma relação mais ecológica e mística com a natureza.

O perfil do "daimista" (como é chamado o adepto da doutrina) da comunidade fundada pelo padrinho Sebastião modificou-se gradativamente a partir de então, deixando de ser constituído exclusivamente por seringueiros e caboclos. Gradativamente, passa a assumir uma nova face, mais cosmopolita, ao integrar esses novos personagens, com suas crenças e hábitos urbano-industriais. Entretanto, a comunidade procura manter-se fiel às origens doutrinárias, buscando assimilar as novas influências e adequá-las às tradições xamânicas. Essas tradições assentam-se em algumas crenças anímicas que conferem aos objetos, substâncias e símbolos, determinados atributos essencialmente sagrados. Sobre a doutrina do Santo Daime e suas crenças, "padrinho" Sebastião é esclarecedor: "...A doutrina não existe, mas se fala. Ninguém doutrina ninguém. Cada um é seu próprio doutrinador. A mãe em sua bondade nos acolhe a todos. Nós usamos as plantas santas sim. Qual é o pecado? Qual é o crime de usar aquilo que brota na terra que é nossa mãe? Tem uma ligação divina nessas plantas que une o reino da Terra com o reino do Céu. A gente seria muito bobo se não usasse elas para descobrir o lado espiritual das coisas. Deus nos manda a sua verdade através da sua obra. Só agora é que vão chegar as pessoas que foram convocadas para dar o testemunho de que essas ervas nos levam aos espíritos. A gente tem que se preparar para ser um povo santo... Temos que nos ajuntar e mostrar o que estamos aprendendo com amor, boas palavras, mansidão. Até encontrar com o Eu Superior. Nisso aqui é que está nossa doutrina... A doutrina somos todos nós, é apresentar uma coisa divina, nós não devemos ter medo, somos um grupo que procuramos o espiritual..." (Alverga,1984, pp. 308-309).

Justamente por estar impregnada pelo sagrado é que se torna possível a inversão dos sinais, que em nossa cultura adquirem sempre significados negativos e, nessa concepção, são colocadas como experiências positivas de encontro, de união com os poderes divinos do universo. Aí, essas "plantas de poder" estão colocadas a serviço da comunidade, não possuindo o caráter anti-social estigmatizado por nossa própria cultura. Elas representam, virtualmente, um elo entre o universo profano e o sagrado. É através delas que esses homens penetram no mundo dos espíritos, no conhecimento esotérico. É importante ressaltar, ainda, que a atual retomada do projeto de organização do Mapiá em comunidade, bem como seu processo de expansão em direção aos grandes centros urbanos e ao exterior, simultaneamente ao processo de abertura interna para a adoção de novas práticas rituais e valores religiosos, são características específicas do CEFLURIS. Entretanto, somente esse fator não parece explicar satisfatoriamente o fenômeno, o que nos leva a buscar nos elementos de positividade, internos ao próprio grupo, as pistas necessárias à compreensão desse processo. (...)"

Marcelo Bolshaw Gomes acrescentará:

Os hinos do Santo Daime também versam sobre uma transformação nas condições de vida da humanidade - “o fim dos tempos”, “o Apocalipse”, “o balanço” - e sobre o advento da utopia social, a “Nova Jerusalém”, “o Reino de Deus na Terra”. Em relação a este ideal de utopia social, os participantes dos rituais afirmam que “a vida comunitária é um aspecto fundamental na doutrina do Santo Daime. Através dela aprendemos e construímos na prática o significado da União, que cantamos nos hinários”. Para eles, “quando tomamos Daime e cantamos hinos estamos apenas acelerando e intensificando conflitos e relações interpessoais que se desenvolvem no nosso cotidiano comunitário”. O objetivo a longo prazo, ao que prece, é conquistar no dia-a-dia uma união material tão sólida quanto a união mística alcançada nas cerimônias. “Assim”, concluem, “realizamos o ideal da Nova Jerusalém”. Desta forma, a União, metáfora da comunidade e símbolo da utopia social, é uma das entidades centrais dos rituais e da filosofia da doutrina do Santo Daime.

O Padrinho Sebastião, além do caderno de hinos por ele ofertados, também possuía um caderno de hinos a ele dedicados. Seu filho, o Padrinho Alfredo, além de passar a "dedicar" hinos de seu próprio caderno desde então (desde o hino 25, "Marcha da Bandeira", dedicado à Madrinha Graça, nora do Padrinho Wilson), também abriu um caderno de hinos dedicados a si, costume que se estendeu e é motivo de hoje contarmos com cadernos de hinário que são conhecidos como sendo do Padrinho Wilson Carneiro ou do Padrinho Manoel Corrente, quando estes na verdade nunca receberam hinos, apenas se tornaram guardiões de hinos a eles dedicados por membros da irmandade do Centro.

Para baixar o "Nova Jerusalém" em mp3, em gravação do Céu do Mapiá, com o caderno das cifras musicais, clique em:

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